Após um caso de MTA e um molar em C, lembrei-me deste caso que é nada mais que a “fusão” dos dois.
Paciente do sexo feminino, com 32 anos de idade marca consulta de urgência por “dor persistente e continua num molar sem conseguir mastigar” .
A paciente foi referenciada por colega da própria clínica para avaliação.
Após anamnese clínica, sem antecedentes médicos de interesse nem não referindo qualquer tipo de alergia. Passamos à exploração intra-oral em que verificamos a ausência do 4.6. No 4.7 existe uma restauração a compósito com uma restauração provisória que nos fez supor uma abertura cameral prévia. Ligeiro edema na zona do 4.7 com queixas à palpação na região apical.
Testes pulpares
Negativos ao frio.
Testes Periodontais
Percussão vertical dor intensa, percussão horizontal aumentada e sondagem periodontal dentro dos limites biológicos normais. Mobilidade grau 1.
Realizámos Rx periapical do 4.7, em que podemos observar uma restauração extensa a compósito, tratamento endodontico prévio e seguramente tentativa do retratamento do mesmo.
Lesão periradicular radiolúcida extensa.
Diagnóstico :
Tratamento endodontico prévio com Abcesso Apical Sintomático.
Pela classificação da Associação Americana de Endodontia é um caso considerado de dificuldade elevada por ter um tratamento endodontico prévio, inflamação aguda e por ser um segundo molar.
Plano de tratamento endodontico e reabilitador :
Retratamento endodontico não cirúrgico e a reabilitação com espigão fibra de vidro e recobrimento cuspídeo com uma coroa total. A reabilitação do espaço edêntulo foi aconselhado mas por motivos económicos não foi aceite.
Após isolamento absoluto com dique de borracha,com a ajuda do microscópio e com ultrasons verificámos que é um dente molar em C de canal único com uma uníca saída apical de calibre superior a 90. Comprimento de trabalho de 18 mm, verificado com Localizador Electrónico de Ápices.
Sempre com uma irrigação copiosa e persistente com hipoclorito de sódio a 5% com activação com lima ultra sónica, procedemos à realização de uma barreira apical com MTA. Utilizámos uma camada de fibrina com Spongostan para evitar um extravasamento exagerado de material obturador devido ao enorme calibre apical. Não por ter algum problema clínico, caso isso sucedesse, mas sim pela relativa proximidade do nervo dentário inferior.
Concluímos a primeira sessão com uma bola de algodão humedecida e material restaurador provisório Cavit. Como terapêutica, apenas se receitou Ibuprofeno 600 mg de 12/ 12 horas durante 3 dias após refeições.
Na consulta seguinte, com a paciente já sem qualquer sintomatologia, verificámos a consistência da barreira apical e procedeu-se ao backfill com gutta-percha fluida com o Obtura II.
Colocou-se três espigões de fibra de vidro invertidos tamanho azul da RELYX FIBER POST e cimentados com RELYX UNICEM APLICAP.
A paciente foi reenviada ao colega referenciador para conclusão da reabilitação.
Foi realizada uma consulta de follow-up após 8 meses com Rx periapical sem qualquer sintomatologia à percussão e uma evidente remissão da lesão periapical.
Luís Côrte-Real
Fantástico! É por isto que adoro endo! Parabéns!
Luís, antes de mais parabéns pelo caso. Começo a achar que mereces a alcunha do MTAleiro… :). Uma pergunta apenas, as paredes mesial e distal pareceram ficar muito finas após a obturação final. Usaste alguma técnica de instrumentação ou limitaste-te a usar os ultrassons? E o ultrassons eram com ponta activa em lima, diamantada ou totalmete passiva? E já agora, concordo com os postes de fibra, de alguma maneira poderão reduzir o ainda assim elevado risco de fractura. Grande abraço!
Filipe Aguilar
Filipe, obrigado pela alcunha 😉
Este é um caso, a meu ver de prognóstico favorável! O risco de uma hipotética fractura parece-me possível e a paciente está informada do risco da mesma. A opção por sermos conservadores foi baseada também nas possibilidades económicas da paciente. A solução, exodontia e implantes foi apresentada e recusada como uma opção possível no plano de tratamento.
Quanto à tua questão técnica,utilizei apenas ultra-sons as pontas Start-X nº2 e nº 3 e não utilizei nenhum tipo de instrumentação rotatória pois não me pareceu fazer sentido já que não teriam nenhum tipo de eficácia mecânica. A lima ultra-sónica foi utilizada apenas para activação dos irrigantes. Os espigões fibra de vidro quanto ao aumento de resistência podem ajudar um pouco mas a sua principal função é essencialmente a retenção para o material do ” build-up”.
Um forte abraço e obrigado pelo teu comentário.
Luís
Luís, quando te disse que os espigões de fibra podiam ajudar a evitar a fractura referia-me em comparação ao uso de espigões fundidos que alguns colegas teimam em usar indiscriminadamente e que num caso destes podia transmitir demasiadas forças à fina parede mesial. Quando te perguntei se usaste alguma técnica de instrumentação, calculei logo que rotatória não terias usado, mas sim se de alguma maneira o ultrassons teria tido alguma actividade mecanica, já que a parede mesial pareceu ficar demasiado estreita quando comparada com a radiografia inicial! But dont take it the wrong way… só estou a criar alguma motivação para a discussão! :)grande abraço
Já agora só mais uma pergunta (por aqui se vê os “alunos” atentos e interessados):
-usas sempre spongostan? ou foi só pela proximidade ao dentário? vês vantagens ou desvantagens no uso do spongostan? (eu já tive algumas dificuldades com o spongostan e deixei de usar) e já agora crês que teria havido problema em “barrar” o dentário com um pouco de MTA?
afinal foram “uma data” de perguntas;)…. acho que nunca fiz tantas “” num comentário;)